Aventuras e desventuras dos professores, formadores, contratados ou a recibos-verdes que leccionam na Escola Pública, Profissionais, Colégios, IEFP's, Casa Pia, TEIP's em cursos de UFCD's, EFA's, EFJ's, CNO's, AEC's PIEF's, ...

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sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

LEGISLAR O SUCESSO

Imaginemos uma escolinha em Portugal. Imaginemos ainda que essa escolinha está situada num dos bairros mais problemáticos do país. Cujos alunos vêm maioritariamente de famílias desfavorecidas, muitas desestruturadas, onde há fome e falta de bens básicos. Uma escolinha onde a polícia tem livre trânsito. Uma escolinha situada num meio onde há droga e violência.

Os alunos dessa escolinha apresentam, naturalmente, muitas dificuldades de aprendizagem. Para muitos, o último dos seus problemas é a escola. Um número significativo deles caiu num dado momento da sua vida em Portugal e foi colocado de forma administrativa a meio de um ciclo de estudos. Muitos deles, aliás, nem falar correctamente sabem porque em casa fala-se crioulo ou dialecto cigano. Quanto a escrever, estamos conversados.

Imaginemos agora que os professores dessa escolinha são confrontados com o facto da taxa de retenção dos seus alunos ser superior à média do país. Imaginemos que o valor de retenção nacional é de 10% e que o da escolinha em questão é, por exemplo, 28,9%. Os professores lamentam mas de facto sentem que, por muito que se esforcem, não conseguirão dar um ambiente propício ao estudo em casa de cada aluno, que não conseguem apagar o facto dos alunos estarem um feixe de nervos em sala de aula por terem presenciado a uma cena de pancadaria em casa, que não podem ir buscá-los a casa sempre que faltam, que não conseguem impedir que meninas de 13 anos engravidem e abandonem a escola, que se conseguirem que na sua sala de aula haja paz, é já uma vitória.

Continuando o exercício de imaginação, suponhamos que a estes professores é apresentado em reunião um quadro que terão de preencher propondo metas de retenção a 5 anos de forma a convergir para a média nacional. Qualquer coisa tipo:

Os professores, intrigados, questionam:

Mas como podemos conhecer as turmas do ano que vem, quanto mais as turmas que estarão na escola dentro de cinco anos, como podemos saber se serão alunos aplicados ou assíduos?
Resposta: Não sabem.

Mas está o governo a pensar dar um maior apoio social às famílias desfavorecidas?
Resposta: Não. Estamos em crise. A ideia é cortar apoios.

Mas o governo está a pensar dar maior autonomia à escola? Permitir à escola flexibilizar programas?
Resposta: Não. E não se esqueçam dos exames de fim de ciclo, que se os vossos alunos não têm bons resultados, a avaliação da escola vem por aí abaixo.

Então talvez o governo esteja a ponderar aumentar os apoios pedagógicos, insistir no ensino do português como língua não materna, diminuir o número de alunos por turma...
Resposta: Nem pensar. A ideia é contenção de despesas. Menos professores porque é preciso poupar.

Então, então...
Resposta: Sim. É isso. Sem contrapartidas nem planos. Só objectivos. Comprometam-se a passá-los.

E pronto. Professores a preencher tabelas com percentagens fictícias que não têm nenhum significado prático senão a pressão para que sejam passados cada vez mais alunos independentemente do contexto.

Imaginação? Há alturas em que a realidade suplanta a ficção...


hbhgh

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